DESAFIO PARA REFLETIR
Você já pensou que muitas vezes agimos por intuição? Você sabe o que é intuição? Será que conseguimos diferenciar intuição de instinto e de inspiração?
Para refletirmos sobre essas perguntas convidamos você a fazer o exercício que se segue.
INSTRUÇÃO: Leia o conto intitulado “Minhas Vidas de Maria” e identifique:
E aí, qual a diferença entre cada um dos termos?
Minhas Vidas de Maria
por Márcia Pereira da Silva
Maria Amália nasceu no Brasil no final do século XIX, filha de um casal pobre, mas de pele clara, algo importante naqueles anos que tinham acabado de presenciar a abolição da escravidão. Seus pais trabalhavam em uma fazenda de café nas proximidades de Piracicaba. Ela foi uma criança feliz, cresceu brincando nas matas da fazenda, com bonecas de pano e pequenos animais de estimação.
Maria Amália não tinha muita ambição, nem muito gosto pelo esforço; queria arrumar um emprego, sair da fazenda, morar na cidade e, se tudo desse certo, constituir família. Também não se importava muito com a situação dos outros, já que pensava: "Afinal, o que eu posso fazer? Sou pobre também, não consigo ajudar ninguém!". Ia levando a vida na rotina de sempre até que conheceu Antônio. E tudo mudou....
Antônio era amigo do filho do patrão. Não era de tantas posses, mas já tinha casa própria em Piracicaba e estava na idade de se casar. Amália e Antônio se apaixonaram e ficaram noivos. Os pais dela não viam a hora do matrimônio se consumar, afinal, o moço era "de classe melhor", "o futuro neto até poderia virar doutor", pensavam. Casaram-se na ala popular da fazenda, mudaram-se para a cidade e os pais de Amália a viam cada vez menos. O genro não gostava muito deles. Não que eles tivessem feito algo, mas eram simples demais, falavam errado, vestiam-se inapropriadamente.... não eram lá pessoas que podiam ser apresentadas à sociedade piracicabana. Temendo perder o marido e a nova condição, Amália foi se afastando dos pais aos poucos e, apesar de notar o choro da mãe, acabou desaparecendo. Quando ela enterrou os pais, o último contato já datava de quinze anos.
Um a um as personagens dessa história desencarnaram. Depois de maior ou menor tempo de recuperação de cada um deles, o encontro de Amália com os pais no plano espiritual foi difícil, marcado por mágoas, ressentimento, mas também perdão e acalentos. Planejaram a reencarnação, aceitaram de bom grado as novas provas e a oportunidade de se redimirem dos erros de outrora.
Maria Amália nasceu Ana Maria, menina da periferia da cidade de São Paulo. Ana Maria não tinha muita ambição, não gostava de estudar, contentava-se em trabalhar desde cedo nas muitas faxinas que a mãe fazia para completar a renda do pai, trabalhador de fábrica grande... vida corrida. Os progenitores da antiga fazenda receberam a antiga filha para novas provas e levavam a vida simples. Nenhum deles tinha gosto por programas sociais, não tinham muita empatia pelos mais desfavorecidos, acreditavam de cada um tinha, no "fim das contas", o que merecia.
Quando Ana Maria chegou a juventude, seus pais viram a menina tímida, de fala mansa, tornar-se mulher agitada, com aqueles estranhos gostos pela vida noturna. Ela conhecera Alfredo, reconheceu nele o amor do passado e ambos, novamente, se apaixonaram. Agora Ana Maria falava em melhorar de vida, em casar-se e ter filhos. Por mais de uma vez os pais alertaram: "Filha, pense melhor! Ele é muito diferente de você". Ana Maria sentia o coração estremecer, mas afastava esse pensamento com outro: "Ele vai mudar, só quer que eu melhore um pouco, ele vai me aceitar como eu sou".
O esperado pedido de casamento veio num dia como qualquer outro em São Paulo, de chuva fina e fria, na frente do portão dos pais, na velha casa de periferia. Alfredo fez o pedido à moça com um sorriso no rosto, um brilhante na mão e uma condição nos lábios: "Nos casamos, você vem comigo, esquece os seus pais e a sua origem; nós arrumamos uma outra história de vida para você!".
Naquele momento, Ana Maria viu todos os seus temores virarem realidade. Teve a sensação de que um futuro terrível lhe esperava. Sentiu muito medo e num assombro disse "adeus", virou as costas para o amado e entrou em casa.
Ela nunca mais viu Alfredo. Acompanhou pelas redes sociais o pomposo casamento dele com a nova namorada. Nunca mais ela teve vontade de se relacionar com alguém, converteu-se ao espiritismo. Ela passou anos na companhia dos pais, com os quais tinha longas conversas.
Mais tarde, Ana Maria fez Faculdade de Letras na USP, tornou-se professora de português. Lembrava-se sempre das conversas na antiga casa da periferia paulistana e, até para honrar aquela lembrança, escreveu-se em um concurso de contos no ano de 1990, no qual ficou com o prêmio de primeiro lugar com a história intitulada "Minhas Vidas de Maria".